Fábio José Lourenço Bezerra
Nos últimos 400 anos, a cultura ocidental vem se pautando por uma visão limitada do universo. Desde o Renascimento, tentando substituir a visão de mundo imposta pela igreja, que naquele período ameaçava com a fogueira quem ousasse desafiar a concepção universal aristotélico-tomista, na qual baseava sua teologia, os pensadores da época passaram a investigar o universo ao seu redor com a metodologia conhecida como método científico.
O método científico surgiu mediante os trabalhos de grandes homens como Kepler, Copérnico, Galileu, Descartes e Isaac Newton. Daí em diante, passou a vigorar, no ocidente, o paradigma cartesiano-newtoniano, cuja característica é ser dualista (separação mente/corpo e homem/universo), reducionista (as interações atômico-moleculares, exclusivamente, são as responsáveis pelo funcionamento do universo e do ser humano) e mecanicista (o universo é como um imenso mecanismo de relógio, que funciona de acordo com os princípios da física newtoniana).
Para Galileu, o que não podia ser medido nem quantificado não era científico. Porém, muitos cientistas trocaram o termo científico por existente, isto é, para eles, o que não pode ser medido nem quantificado é considerado inexistente.
Descartes acreditava que devia ser separada a mente do corpo. Este, assim como o universo, deveria ser estudado pela ciência, enquanto que a mente possuía outra natureza. Contudo, como não foi possível quantificar a mente, muitos cientistas (os mesmos que citamos no parágrafo acima) chegaram à conclusão de que ela e o corpo eram uma coisa só, sendo a mente produto do corpo. O homem, de acordo com esse pensamento, seria mero robô biológico e o pensamento, os sentimentos, a personalidade, enfim, a consciência humana, não passaria de mera secreção do cérebro, sendo este o resultado de inúmeras experiências realizadas pelo “deus acaso” ao longo de milhões de anos, durante a evolução “Darwiniana” da vida.
Dessa forma, para muitos homens de ciência, sobretudo ocidentais, como só o que podem medir e quantificar é matéria, passaram a adotar a crença materialista, isto é, para eles, só o que existe é matéria.
Todavia, ao longo da história da humanidade, por inúmeras vezes os paradigmas foram quebrados, devido a novas informações que contradiziam o modelo vigente. Assim, o Homem um dia acreditou ser a Terra o centro do Universo, com estrelas, planetas, e até o sol girando ao seu redor; que do céu não caíam pedras; que o átomo era indivisível; que o Universo era estático; que era impossível para o homem voar; que era impossível que, através de um fio metálico não oco, o homem pudesse se comunicar a longas distâncias; que era impossível viajar a velocidades acima de 30 KM/h, pois do contrário o indivíduo ficaria sem poder respirar.
Hoje sabemos que a Terra gira em torno do Sol, que por sua vez gira em torno de uma galáxia, a Via-Láctea, e esta é apenas uma dentre as dezenas de bilhões de galáxias conhecidas; diariamente pedras caem do céu: são os meteoros, popularmente conhecidos como estrelas cadentes; o átomo é composto por várias sub-partículas, e átomos mais pesados podem ser quebrados mediante fissão nuclear; o Universo está em expansão, com as galáxias se afastando umas das outras como manchas pintadas em uma bola de soprar que se enche, processo iniciado desde o Big Bang ; voar hoje se tornou uma rotina, e nesse momento uma sonda espacial (a Voyager II) se distancia do sistema solar rumo a destino ignorado; temos a internet, permitindo ao homem compartilhar informações de um pólo a outro do globo terrestre. Seria possível ao homem do século 19 sequer imaginar a internet? ; temos hoje carros que correm a mais de 300 KM/h, sem que o piloto, ao viajar neles, sufoque por isso.
A concepção de realidade do ser humano modificou-se radicalmente na medida em que ele adquiria conhecimentos e questionava o que se supunha real até então. Quando o homem descobriu a existência dos microrganismos (bactérias, protozoários, etc.), sua noção de vida mudou radicalmente, não só pela descoberta da origem de diversas doenças, como também a possibilidade de existirem seres vivos de dimensões tão reduzidas, que comparados a nós, estão muito mais próximos do nível molecular, uma verdadeira revolução na ciência de então, conhecimento este que teve de enfrentar muita resistência para ser aceito pela comunidade científica da época. Descobria-se um novo mundo.
Quando observamos os materiais ao nosso redor (as paredes da nossa casa, as portas, os móveis, nosso corpo, etc.) pensamos que são compactos, densos. Porém, após as experiências de Rutheford em 1911, sabemos que o raio dos átomos é de 10.000 a 100.000 vezes maior que o núcleo, isto é, se o núcleo tivesse o tamanho de uma bola de pingue-pongue (o núcleo concentra praticamente toda a massa de átomo), o átomo teria o diâmetro do tamanho do estádio do Maracanã. A matéria que conhecemos é cheia de espaço vazio (cerca de 99,99%), apesar de nossos sentidos dizerem o contrário.
O ambiente à nossa volta é percorrido por ondas eletromagnéticas de diversos comprimentos de onda (microondas, radiação infravermelha, ondas de rádio, raios ultravioleta, etc.), algumas podemos verificar a presença quando ligamos o rádio, a televisão, quando atendemos o celular. Estes aparelhos conseguem captar estas ondas e transformá-las em estímulos que podem impressionar nossos sentidos. Contudo, nossos sentidos nada captam diretamente. Alguns insetos percebem a radiação ultravioleta, assim como os cães percebem sons de alta freqüência, que nós humanos não percebemos. O sol, os planetas, as galáxias, os quasares, emitem ondas eletromagnéticas que podem ser captadas pelos nossos radiotelescópios. No entanto, na antiguidade não existia esse equipamento. Para os povos antigos, essas ondas não faziam parte da sua concepção de realidade. Mas por esse fato, essas ondas eram menos reais do que são hoje?
Os astrofísicos da atualidade estimam que apenas 4% da matéria do nosso Universo é conhecida, sendo os outros 96% composto de energia e matéria escuras, de composição desconhecida.
A física quântica veio revolucionar o que se conhecia até então sobre o mundo subatômico (Ver o texto “Por que ser Espírita?”, neste blog). Para Niels Bohr “todo juízo de existência é abusivo”, isto é, segundo Bohr, o objetivo da ciência é o de apenas descrever os fenômenos da natureza, porém jamais o de explicar a realidade. De acordo com Bernard Despagnat, um dos mais eminentes teóricos da física quântica, além dos fenômenos naturais apreendidos pela ciência, existiria uma “realidade última”, “velada”, diante da qual a ciência permanece muda, pois ela só pode apreender, operacionalmente falando, os seus reflexos. A realidade manifesta, percebida, seria um mero reflexo do real. O brilhante astrônomo Camille Flamarion, no século 19, escreveu: “ O desconhecido de ontem é a verdade de amanhã”.
O que pensar de todas as informações acima? Que conceitos podemos formar do que seja realidade? A realidade é um conceito relativo, limitado ao que conhecemos, modelo mental de realidade que criamos, podendo o mesmo, a qualquer momento, ser quebrado por novas descobertas.
A história da ciência, como vimos acima, nos mostra que devemos ter a mente sempre aberta a novas idéias. Devemos estar sempre dispostos a rever nossos paradigmas, evitando assumir uma postura arrogante, sendo humildes perante aquilo que desconhecemos, seguindo o exemplo de um grande filósofo da antiguidade, Sócrates, que disse: “Só sei que nada sei!”. Claro que não devemos simplesmente adotar toda e qualquer idéia ou informação que nos seja apresentada, e sim pô-la em exame rigoroso, porém nada rejeitando a priori. Foi com essa postura que grandes homens de ciência revolucionaram o mundo com suas descobertas, contrariando a muitos, contribuindo para a construção da base na qual se assenta o conhecimento científico atual.
O Espiritismo surgiu a partir do estudo de fenômenos que não se encaixam nas leis naturais
conhecidas pela ciência oficial (aqueles que, falando de uma forma geral, hoje chamamos de fenômenos paranormais), e cujos postulados vêm sendo confirmados por inúmeros pesquisadores independentes, muitos não espíritas
(Ver o texto “Por que ser Espírita?”, neste blog).
Um fator, alegado por muitos cientistas, causador do desinteresse de boa parte da comunidade científica para com os fenômenos espíritas, é que eles não podem ser reproduzidos à vontade num laboratório, quantas vezes se queira, como ocorre com as reações químicas, por exemplo, ou experiências relativas à eletricidade. Ora, nem por isso cientistas de renome deixaram de estudá-los, como foi o caso de William Crookes, que realizou experiências muito bem sucedidas com os médiuns Daniel Dunglas Home e Florence Cook. É necessária boa dose de paciência, para deixar os fenômenos ocorrerem espontaneamente, pois deve ser lembrado o fato de se estar lidando com inteligências possuidoras de vontade própria, sendo necessário, portanto, o respeito a essa vontade, sem a qual os fenômenos não se processam. Junte-se a isso o fato de que, assim como determinadas reações químicas só ocorrem sob determinadas condições (ausência ou presença de luz, temperatura, pressão, adição de determinado catalisador, etc.) obedecendo a leis químicas e físicas, os fenômenos espíritas só ocorrem quando as condições do ambiente onde se dá a experiência sejam adequadas, pois não só o médium como também quem assiste às experiências afeta os resultados, seja com pensamentos, seja com substâncias prejudiciais que tenham ingerido antes (álcool, fumo, etc.). Os assistentes também contribuem, embora em menor escala, com ectoplasma, inconscientemente, para a produção dos fenômenos. A luz, por exemplo, dificulta a materialização dos espíritos, por desagregar o ectoplasma, embora algumas experiências de materialização tenham sido bem sucedidas em plena luz. Estes fenômenos obedecem a leis físicas às quais estamos bem longe de compreender. Muito do obtido nas experiências deve-se à orientação dos próprios espíritos, conhecedores destas leis. Devemos respeitá-las, assim como em qualquer experiência científica tradicional.
Além disso, será que podemos simplesmente ignorar o testemunho de milhões e milhões de pessoas que presenciaram estes fenômenos (inclusos aí vários cientistas de renome em sua época), de todo o mundo e das mais diferentes culturas, inclusive existindo vários registros históricos deles?
A Doutrina Espírita vem nos revelar que somos Espíritos. Ser Imortal, fonte da inteligência, memória, sensações, emoções, personalidade e vontade do ser humano. Muito além do corpo físico, que nada mais é do que uma veste, que é trocada quando necessário. Com o potencial de atingir níveis de inteligência e moralidade cada vez maiores, ou seja, de evoluir.
Paralelo ao nosso universo material, existe um
universo de matéria sutil, imperceptível aos nossos cinco sentidos e aos nossos atuais instrumentos, muito mais amplo e complexo que o nosso, que poderíamos chamar de
Mundo Espiritual. Ele já existia antes da formação do nosso universo
(Ver os textos “O Mundo Espiritual” e “O Mundo Espiritual - Parte 2”, neste blog).
O Espírito, aglutinando em torno de si matéria do Mundo Espiritual, forma o chamado corpo espiritual, também chamado de Perispírito (palavra que significa: em torno do Espírito). É ele que é visto quando acontecem as aparições de fantasmas. O corpo espiritual serve de intermediário entre o Espírito e o corpo físico, funcionando como elo de ligação e canal de troca de informações entre ambos.
Assim como o corpo físico nos serve para transitar pelo mundo material, percebê-lo e interagir com ele, da mesma forma, o corpo espiritual nos serve como veículo e meio de interação com o mundo espiritual, assumindo a forma do corpo físico que tivemos em nossa última encarnação (Espíritos que já atingiram certo grau evolutivo podem dar a seu corpo espiritual a forma que desejarem). Ainda estando em um baixo nível evolutivo, molda-o com a forma de sua última encarnação, porém de forma inconsciente.
Com o corpo espiritual, o Espírito estabelece a sua individualidade, perante os demais, no mundo espiritual.
Contudo, apenas quando desencarnado, isto é, após a morte, ele pode perceber o mundo espiritual, pois uma vez estando ligado a um corpo físico, ele só percebe através deste, pelos cinco sentidos, as impressões do mundo material. A exceção a esta regra são os médiuns, que podem perceber o mundo espiritual mesmo estando encarnados, conforme o seu tipo, ou tipos, de mediunidade, e do quanto esta está desenvolvida. O único tipo de percepção que todos os Espíritos encarnados possuem, sem exceção, relativamente ao mundo espiritual, é a intuição. É através dela que recebemos sugestões dos Espíritos desencarnados, sejam eles bons ou maus, e que, muitas vezes, tomamos como se fossem nossos próprios pensamentos.
As diferenças morais e intelectuais, que verificamos entre as pessoas, resultam dos diferentes graus de evolução que possuem. Se são muito inteligentes e/ou bons, é que desenvolveram essas qualidades ao longo de suas várias existências no mundo material. Mesmo esquecendo os detalhes das vidas anteriores (memória factual) temporariamente durante a vida presente, os Espíritos encarnados conservam a memória intuitiva do que aprenderam em outras existências, e isso os impele a formar sua personalidade atual, juntamente com tudo o que o ambiente proporciona durante a vida, principalmente na infância. A capacidade de aprender essa ou aquela matéria da escola, as tendências para essa ou aquela profissão, gostos, fobias (como a claustrofobia, que é o medo de ficar em lugares fechados), que não possuem explicação nesta existência, é devido ao que foi adquirido em vidas anteriores. Isso sem falar que o cérebro possui grande influência nesse processo, atuando como filtro, inibindo ou liberando essas potencialidades, dependendo do desenvolvimento ou não de suas partes constituintes, responsáveis por essa ou aquela função mental (memória, raciocínio, emoções, etc). A deficiência mental e a loucura, por exemplo, existem devido a essa influência. Espíritos de grande desenvolvimento intelectual podem estar aprisionados em um corpo cujo cérebro, pouco desenvolvido, os impede de manifestar sua inteligência.
Os diferentes graus evolutivos dos Espíritos se devem ao fato de eles terem sido criados simples e ignorantes e em tempos diferentes, dependendo o grau de evolução da maior ou menor experiência adquirida, ou seja, o número de encarnações por que já passaram. O Espírito permanece, por vezes, temporariamente estacionário, por sua própria vontade, apegado que fica, em alguns casos, àquela condição, até conscientizar-se da necessidade de evoluir.
Todos os Espíritos são iguais, não existindo privilégios, pois foram criados com as mesmas potencialidades e as mesmas oportunidades de evoluir e chegar à perfeição, quando, a partir daí, desfrutam da felicidade absoluta, prêmio que recebem após uma longa e laboriosa jornada evolutiva. Condizente com a soberana justiça e bondade do Criador.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:
1 TARNAS, Richard. A epopéia do pensamento ocidental, 2005.
2 NOVAIS, Vera Lúcia Duarte de. Química Geral, 1983.
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5 KARDEC, Allan. O livro dos espíritos, 1992.
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7 WEISS, Brian L. Muitas vidas, muitos mestres, 1988.
8 WAMBACH, Helen. Recordando vidas passadas, 1978.
9 MOODY Jr., Raymond A. Vida depois da vida, 1979.
10 ANDRADE, Hernani Guimarães. Parapsicologia: uma visão panorâmica, 2002.
11 WALLACE, Alfred Russel. O Aspecto Científico do sobrenatural.
12 LIMA, Ronie. A Vida Além da Vida, 2005.