O Umbral
Fonte da imagem: http://saintgermanchamavioleta.blogspot.com.br/2012/10/sobre-traducao-da-palavra-umbral-nas.html
Fábio José Lourenço
Bezerra
Extraímos esse
interessantíssimo relato, de um suicida que passou por uma EQM, do site www.nderf.org,
do Dr. Jeffrey Long, cuja pesquisa já nos referimos no texto “Estudo Inédito Sobre Experiências de Quase Morte Conclui: Existe Vida Após a Morte”,
neste blog. Vejamos:
“EQM de um Suicida
|
EXPERIÊNCIA:
A dor, o terror
e o choque daquela grave noite de outubro de 1960 ainda me perseguem passados
38 anos. Mais difícil de explicar é a consciência da ilimitada piedade e do
perdão de Deus que surgiu após a minha tentativa de suicídio e que permanece
até hoje. O que estou prestes a narrar não se trata em absoluto de alucinação
ou auto engano. Eu relato o que aconteceu e desejo com isto poder ajudar
alguém, em algum lugar, a reconhecer e acolher a presença de Deus em sua vida
em um momento quando a morte possa parecer a única saída. Se alguém me
dissesse, 38 anos antes, que eu iria percorrer o perigoso caminho da perda de
fé até o fosso do inferno, eu teria rido. Eis a história.
Em 1948, eu
estava recém-casado com uma bela mulher de nome Pat. Ela era uma garota popular
e eu me sentia um privilegiado por tê-la conquistado. Eu estava completamente
envolvido em meu trabalho como contador e ocupado com o lado positivo da vida
que nem pode notar a aproximação de uma tormenta. Nos anos seguintes, todas as
minhas esperanças, sonhos e brilhantes perspectivas erodiram-se. Eu que sempre
fora um moderado e ocasional bebedor passei a beber mais e bebidas mais fortes.
Antes de dar-me conta disto, já tinha ultrapassado o limiar tornando-me um
alcoólatra. O limiar era o inferno da perda de fé, temores, impotência e auto
compaixão.
Passados apenas
sete meses de um casamento que eu julgava perfeito, descobri que minha mulher
me traía, o que me levou ao abandono e ao álcool. Eu era, também, culpado pelo
naufrágio do nosso casamento. Toda vez que um novo caso amoroso vinha à tona —
fosse um pequeno caso ou um romance de um ano — eu lhe dizia muitas coisas
ofensivas e fazia todo possível para que ela se sentisse bastante culpada. Ela
continuava mesmo assim, e havia saído para um encontro quando, por fim, tomei a
decisão de fazer algo frente a essa situação desesperadora e degradante.
Com Pat ausente
— provavelmente a noite inteira—, levei nossos dois meninos e nossa filhinha
para a cama e ouvi as suas orações. Nessa altura, as orações pareciam-me, de
algum modo, vazias e sem sentido. Eu não encontrava segurança ou esperança nas
preces. Tornei-me um devoto ateísta. Quando as crianças já dormiam, reuni todos
os apetrechos para o que seria a minha "fuga final”: dois frascos de
pílulas para dormir e uma medicação prescrita ― tranquilizantes que eu
acumulara para o futuro ― retirados do armário de medicamentos. A isto, juntei
três garrafas de bebida. Pensava ter tudo o que precisava para a minha grande
fuga. Lembrava que o médico havia dito para não ingerir álcool com estas
pílulas pois isso poderia matar-me. Naquele momento, não tinha desejo de
morrer, mas ainda assim a conversa semeou um pensamento suicida.
Eu escrevi uma
mensagem de suicida e agitei cinco frascos de tranquilizantes. Misturei a isto
as bebidas e brindei à cadeira vazia de minha mulher. “Isto é para um
nada, torne-se isto o nada.” As cápsulas desceram facilmente e o falso calor da
bebida invadiu-me. “On my way”* ― pensei ― e sem volta!
A minha segunda
bebida terminou com os tranquilizantes e as pontas dos dedos das mãos e dos pés
começaram a formigar. Bem, talvez as pílulas não façam efeito depois de tudo ―
disse para mim. Eu não me sentia bêbado, apenas um pouco entorpecido e tonto.
Eu tinha um perturbante temor de ser interrompido em minha tentativa, tal como
acontecera com tudo mais que eu considerara importante; engoli, então, um
punhado de pílulas para dormir. A minha mão ainda estava firme enquanto
servia-me do resto dobourbon. O que posso fazer, o que farei se isto não
funcionar? Senti uma sensação de queima formando-se em meu estômago.
Meu hábito
alcoólico tornara-se tão intenso que um par de drinques ao almoço, um
trago no caminho de casa, dois-quintos de vodka ou bourbon ao
terminar a noite eram completamente insuficientes para entorpecer a minha dor e
frustração. Eu não quero acordar com apenas mais uma ressaca e todos os
problemas continuando a corroer-me. Eu não quero acordar nunca mais. Eu
terminei com toda a bebida e as pílulas e comecei a ver algo como uma nuvem
escura vindo em minha direção. A nuvem atravessou o teto da cozinha e chegou,
envolvendo-me.
Comecei a sentir
que me movia através de um túnel a uma alta velocidade. Eu vi uma luz no fim do
túnel e pensei se esse seria o lugar para onde estaria indo. Eu não tinha ideia
se estava vivo ou morto nessa altura, mas lembro claramente de ter olhado para
trás e ter-me visto desmaiado no chão da cozinha. Eu estava lá completamente
inconsciente dessa outra parte de mim que ia em direção a alguma coisa. É isto
a morte? ― indaguei-me. “Não!”― foi a resposta vinda de algum lugar.
Fiquei surpreso,
então, ao ver um ser de extraordinária beleza, irradiando um amor supremo, de
grande compaixão e calor. Era um ser envolto em uma bela e brilhante luz
branca, com raios prateados emanando do seu centro. Eu hesitava em dizer alguma
coisa, mas logo percebi que meus pensamentos podiam ser lidos por esse ser de
incrível luz. “Não!”― repetiu ele. “A morte não se parece a isto. Venha, vou
mostrar-lhe.” Recordo ter flutuado com ele sobre uma espécie de fosso onde se
via uma paisagem deprimente, desprovida de beleza, desprovida de vida, onde as
pessoas se arrastavam, cabisbaixas, com os ombros dobrados para a frente de uma
maneira depressiva e resignada. Elas mantinham as cabeças baixas olhando para
os pés e vagavam sem rumo, tropeçando, às vezes, umas nas outras mas continuando
a andar. Pensei, terrificado, se seria lançado a esse mundo de almas confusas e
perdidas. A voz, entretanto, pareceu ter compreendido o meu terror e aliviou-o
com as seguintes palavras: “ Este é um Inferno de sua própria criação. Você
teria finalmente de retornar à terra e experimentar, de novo, uma outra vida,
enfrentando as mesmas dificuldades que enfrentou neste período. Até lá,
você permanecerá junto a essas almas perdidas e confusas. O suicídio não é uma
saída.”
Foi-me mostrada
uma visão panorâmica da minha vida. Os últimos cinco anos ― destruídos pelo
abuso de álcool ―, foram os mais dolorosos, as mais dolorosas lembranças que eu
jamais ousaria imaginar. Eu vi uma imagem do efeito que o álcool havia causado
à vida das minhas crianças e o efeito que iria causar no futuro de cada um
deles. Eu vi a dor que as minhas crianças iriam sentir com a minha perda e da
família. Eu vi que sua mãe não iria cuidar bem deles e que, por fim, eles iriam
parar em um lar adotivo. Também me foi mostrada uma prévia de como o meu
alcoolismo iria influenciar a vida de meus filhos se continuasse a beber com a
mesma intensidade e permanecesse dentro daquela relação familiar. Eu vi que
todas as três crianças — dois meninos e uma menina — seguiriam o meu pobre
exemplo e cada um iria usar a bebida para escapar do estresse da vida
quotidiana até que se tornassem, por sua vez, também alcoólatras. A visão da
minha preciosa filha crescendo e casando-se com um indivíduo alcoólatra, que
por fim iria bater nela e forçar relações incestuosas com suas quatro filhas
era mais do que eu podia suportar. Foi como uma bofetada em meu rosto. Uma
monstruosa visão da realidade.
Eu vi que se
adequasse meus atos e começasse a agir como um pai responsável e modelo de
referência, as três crianças tornar-se-iam felizes e produtivas. Isso não
significa que estariam livres das lutas diárias, mas sim que teriam a
possibilidade de construir seus próprios caminhos, livres de qualquer
dependência. Eu vi como o meu filho mais velho tornar-se-ia uma importante e
influente pessoa em seu tempo se eu permanecesse por perto e fosse um
verdadeiro pai. Eu vi o lado reverso desse futuro se eu continuasse a ser o pai
fraco e alcoólatra: ele finalmente iria envolver-se com drogas e terminar em
uma prisão por crimes cometidos ao tentar conseguir dinheiro para a compra de
entorpecentes. Foi aterrorizante, e decidi imediatamente que não era isso
o que desejava para meus filhos, ou para mim. Foi-me mostrado que se
continuasse como um bêbado patético, uma nulidade, não teria condições de
escapar. Tendo de reviver todas as provações e traumas que levaram-me ao ponto
do suicídio, ter de enfrentar tudo isso novamente em uma outra vida era
simplesmente muito mais aterrorizante do que eu gostaria de admitir. Eu chorei.
O ser luminoso
pareceu compreender que eu estava cheio de remorsos, compaixão e amor. Com voz
severa mas, ainda assim, em tom paternal, ele disse: “Você não pode fazer o que
quiser com a sua vida. Você criou a si mesmo, deu a si mesmo vida? Não. Da
mesma forma, não poderá escolher a morte.” Eu não podia falar, eu não podia
pensar, eu chorei ainda mais. Essa presença, na forma de voz, deveria ser o
Espírito Santo que me foi enviado ― pensei. A voz, agora mais suave, continuou:
“ Eu não terminei com você, o seu trabalho não está concluído, volte e faça o
que deve ser feito.”
A primeira coisa
que vi ao acordar foi o alívio transbordando da face de minha filha. Nancy
tinha acordado durante a noite e lutara incessantemente para manter acesa a
faísca de vida dentro de mim. “Oh! Papai” ― disse ela ―, “ Eu tive tanto medo
de perdermos você. Você estava tão frio e eu nem podia ouvir o bater do seu
coração.”
Na cozinha, a
minha mulher estava preparando o almoço. “ Venham, crianças, e sirvam-se”―
disse ela ― “ e você pode servir-se também se conseguir arrastar a sua figura
bêbada até a mesa “, ― acrescentou sarcasticamente. Eu sentia-me completamente
exausto e faminto mas não de ressaca. Por alguma estranha razão, eu não tinha a
dor aguda nos intestinos que sentira na noite anterior depois da overdose de
pílulas. Melhor ainda: tinha comigo o amor, a paz e o carinho interior
vindos da noite passada.
Seria agradável
dizer que a vida depois disso tornou-se perfeita mas seria uma mentira. A
separação e o divórcio foram de doer o coração embora eu tenha ficado com a
guarda das crianças. Eu queria as crianças e elas me queriam e o namorado de
minha mulher não as queria. Eu deixei a minha profissão de contador e prossegui
para tornar-me professor em uma faculdade local e foi uma PASSAGEM dura.
Usei todas as
minhas economias e os fundos de aposentadoria para pagar as contas e manter a
família durante o período de um mês de busca de emprego. Isso custou-me
qualquer garantia que poderia ter tido para desenvolver novas capacidades
profissionais, algo, por vezes, desafiante e assustador. Ainda assim a
paz e o conforto que senti, quando estava à beira do abismo do inferno, nunca
deixou-me nem permitiu-me perder a minha renovada fé e confiança. Alguns amigos
não compreendem porque não me tornei amargo; a melhor resposta está no Salmo
23. “Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum,
porque Tu estás comigo; a Tua vara e o Teu cajado me consolam.”
Desde essa
experiência, sinto que não temo mais a morte, que possuo uma perspectiva mais
espiritual e que assumo a responsabilidade de criar meus filhos muito mais
seriamente. Eu estou lá para eles e sinto orgulho ao dizer que suas vidas estão
se desenvolvendo muito melhor agora depois que tornei-me o pai que sempre
deveria ter sido. Eu encontrei e casei-me com uma bela mulher, também bela em
seu interior, e que me dá força e a coragem para enfrentar as provas e
atribulações da vida. Eu nunca esquecerei a minha experiência às portas
do inferno e o que ela me ensinou.
A Experiência de
Quase Morte negativa não é negativa quando o bom surge dela. Eu sou agora um
conselheiro pastoral e, em paralelo, faço contabilidade para pequenos negócios.
Os meus filhos são independentes e tem vidas felizes, ativas e produtivas. Eu
me sinto em paz.”
______
NT: On
My Way - referência à música de Phil Collins.
O mundo espiritual está organizado em inúmeros planos de existência. O que os diferencia é a frequência vibratória de cada um. Isto é, a
sutileza das substâncias que formam cada plano de existência depende da rapidez com que estas
substâncias vibram. Quanto mais rápida a vibração, mais sutis são estas
substâncias; quanto mais lentas em sua vibração, mais grosseiras e mais próximas
das substâncias do mundo material. Quando um Espírito encontra-se em
desequilíbrio psíquico, ainda é egoísta, orgulhoso e/ou ainda está muito
apegado ao mundo material, as substâncias do seu corpo espiritual vibram muito pouco. Isto faz com
que ele se situe em um plano espiritual mais grosseiro, porque sintoniza com
ele. O Espiritismo chama o conjunto destes planos espirituais grosseiros de Umbral.
O suicida do relato acima teve um vislumbre do Umbral, o que pode ser deduzido
quando escreveu: “Recordo ter flutuado com ele
sobre uma espécie de fosso onde se via uma paisagem deprimente, desprovida de
beleza, desprovida de vida, onde as pessoas se arrastavam, cabisbaixas, com os
ombros dobrados para a frente de uma maneira depressiva e resignada. Elas
mantinham as cabeças baixas olhando para os pés e vagavam sem rumo, tropeçando,
às vezes, umas nas outras mas continuando a andar.”. Ele, por ser um suicida,
em evidente desequilíbrio psíquico, estava sintonizado com o Umbral, mas estava
sob a proteção de um bom Espírito.
Em vários outros relatos de EQM aparece o Umbral. No seu livro de 1977, de
título “Reflexões Sobre Vida Depois da Vida”, o Dr. Raymond Moody Jr.,
pioneiro no estudo das EQMs, diz ter ouvido muitos deles. Ele escreveu: “Diversas
pessoas contaram-me que, a certa altura, viram de relance outros entes que
pareciam estar “presos” num estado de existência aparentemente infeliz. Os
indivíduos que descreveram esses entes confusos concordam em vários pontos. Em
primeiro lugar, declaram que tais entes pareciam, com efeito, incapazes de abrir
mão de seus apegos ao mundo físico. Um homem afirmou que os espíritos por ele
avistados pareciam “não conseguirem progredir no outro lado porque seu Deus
ainda continua a viver do lado de cá”. Isto é, pareciam ligados a um
determinado objeto, pessoa ou hábito. Em segundo lugar, todos comentam que os referidos
entes pareciam “embotados”, que sua consciência dava a impressão de estar, de
algum modo, limitada em comparação com a dos demais. E terceiro lugar, dizem que tais “espíritos
embotados” pareciam destinados a permanecer ali apenas até que conseguissem
solucionar o problema ou dificuldade que os mantinha naquele estado de
perplexidade.”
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:
MOODY
JR, Raymond. Reflexões sobre vida depois da vida. Ed. Nórdica. [1977]
ENDEREÇO ELETRÔNICO CONSULTADO:
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