sexta-feira, 15 de março de 2013

O QUE REALMENTE JESUS ENSINOU?


Fonte da imagem: http://iris_orion.blogs.sapo.pt/489680.html

Fábio José Lourenço Bezerra

                Os Espíritos Superiores, durante a Codificação do Espiritismo, revelaram que Jesus foi o Espírito mais perfeito que Deus nos enviou, encarnando na Terra com a missão de servir de guia e modelo para a humanidade. Ou seja, devemos seguir seus ensinamentos, e nos basear em seus exemplos, para que possamos trilhar o caminho da perfeição espiritual.
                Contudo, logo após o seu retorno ao mundo espiritual, sua palavra foi sendo transmitida como tradição oral, isto é, no boca-a-boca dos chamados cristão novos, aqueles que eram convertidos ao cristianismo nascente. Os estudiosos dos evangelhos concluíram que eles só foram escritos entre 30 a 60 anos após a morte de Jesus.
Imaginemos a seguinte experiência: colocamos dez pessoas em fila, falamos algo no ouvido da primeira pessoa e pedimos que ela faça o mesmo com quem está atrás, e assim sucessivamente, até a mensagem chegar ao último da fila. Veremos que a mensagem, ao longo deste curto caminho, chega bastante distorcida. Foi o que aconteceu com a mensagem de Jesus, só que ao longo de décadas, por pessoas dos mais diferentes graus de cultura e tipos de crença, tendo depois sido escritas por pessoas que sequer o conheceram pessoalmente.  Atribuíram, incorretamente, a escrita dos evangelhos aos apóstolos de Jesus. Por exemplo, os evangelhos aceitos pela Igreja – Marcos, Mateus e João, além de Lucas – conforme os estudiosos, não foram os próprios que os escreveram. E pior: não temos os originais destes primeiros escritos, apenas cópias das cópias das cópias das cópias... e todas em grego antigo, que não era a língua original de Jesus nem de seus apóstolos, que falavam o aramaico. São em torno de cinco mil cópias, com muitas contradições entre si. Essas contradições de palavras, frases ou mesmo textos inteiros, foram provocadas por erro acidental dos copistas – afinal o processo de cópia era o manuscrito – e também, em muitos casos, proposital, para acomodar as palavras de Jesus à crença de determinado segmento cristão primitivo, que, como sabemos, existiam muitos (para maiores detalhes, ver o texto Quem é Jesus?, neste blog).
Diante de tantas contradições, como, então, poderemos saber quais as verdadeiras palavras do Mestre Jesus?
Não restam dúvidas de que o Espiritismo pode nos dar uma chave para compreender não só os Evangelhos do Cristo, mas a Bíblia como um todo. Contudo, uma vez que a Doutrina Espírita não é dogmática, isto é, não pretende impor verdades absolutas, inquestionáveis, recomendando a seus seguidores o uso da razão e do pensamento crítico, é aconselhável que verifiquemos o que os estudiosos da Bíblia têm a nos dizer sobre a questão.
Em 1985, houve uma reunião de bibliólogos (estudiosos da Bíblia) – o chamado Seminário de Jesus – para discutir e votar quais, dentre as mais de 1.500 frases supostamente ditas pelo Cristo, seriam autênticas, e até que ponto. O livro “The Five Gospels: What Did Jesus Really Say?” [Os cinco evangelhos: O que Jesus realmente disse?] foi fruto desse estudo. O resultado dele foi que apenas vinte frases foram realmente ditas pelo Cristo, exatamente da forma como se encontram nos evangelhos. É interessante notar que, além dos Evangelhos aceitos pela igreja, que já citamos acima, o estudo também considerou o Evangelho de Tomé, achado na década de 40 do século passado e, provavelmente, o mais antigo dos cinco (para mais detalhes sobre este evangelho, ver o texto Quem é Jesus?, neste blog).
O autor Juan Arias estudou teologia e jornalismo na Universidade Gregoriana de Roma; línguas semíticas no Pontifício Instituto Bíblico; foi correspondente do jornal El País no Vaticano durante 14 anos, ocasião em que pôde acompanhar os papas Paulo VI e João Paulo II; atualmente, é colaborador de El País para a América Latina. Ele escreveu o excelente livro “O Grande Segredo de Jesus: Uma Leitura Revolucionária dos Evangelhos”. Nele, ele se refere assim às conclusões do estudo acima referido:
“[...] Curiosamente, trata-se dos dizeres que a Igreja sempre considerou de difícil interpretação, as frases mais duras contra os poderes constituídos e as mais enigmáticas e surpreendentes, como “Deixa os mortos enterrarem os mortos”. Estas são justamente as palavras e narrativas mais usadas neste livro e que, curiosamente, mais que o resto dos Evangelhos, confirmam a nossa tese de que Jesus propunha uma ruptura total com o sistema existente e falava para uma possível raça futura de seres inteligentes diferente da atual, baseada na solidariedade, no amor aos inimigos, na aceitação dos diferentes e no respeito à dignidade da pessoa, sem qualquer distinção de raça, fé, gênero etc., e não na violência.”
A respeito de Jesus, ele diz:
“[...] Jesus sempre foi apresentado como um líder religioso que deu origem a uma nova Igreja nascida do Judaísmo, o que não é verdade. Jesus nunca pensou em fundar uma nova religião, pois combatia todas elas devido ao fato de se basearem na violência e nos ritos sacrificiais, na dor e na falta de liberdade.”
“[...] O obscuro profeta da minúscula aldeia palestina de Nazaré parece dirigir-se a homens e mulheres de uma espécie humana vindoura. Talvez, com a força do amor desinteressado que impulsionava sua vida, ele se sentisse cidadão deste novo mundo sem violência, do qual acabou sendo vítima inocente e inevitável. Isso significa que, segundo a teoria deste livro, Jesus não falava aos homens da sua época, a esta raça humana? De jeito nenhum. Jesus também falou para nós, seres humanos violentos e ambiciosos inclinados a usar os mecanismos do amor em proveito próprio. O ser humano pode melhorar, e de fato alguns, a começar pelo próprio Jesus vítima da violência, alcançaram a sublimidade do amor que ele propunha. No entanto, as suas intenções e seu alvo iam mais além, e ele nos indicou que o grande segredo que estava revelando era que aquela loucura de um mundo sem violência não era uma simples utopia, e algum dia outros seres humanos, seja lá o nome que recebam, poderiam conseguí-lo.”
De fato, conforme o Espiritismo nos ensina, a Terra está caminhando da categoria de mundo de provas e expiações, onde o mal prevalece, para um mundo de regeneração, onde as almas que ainda têm o que expiar vão haurir novas forças, repousando das fadigas da luta; em seguida para mundo feliz, onde o bem se sobrepõe ao mal; e finalmente para mundo celeste ou divino, morada dos Espíritos depurados, onde o bem reina inteiramente (ver o texto Um Dia, o Bem Reinará na Terra?, neste blog).

No Capítulo XVIII, em sua obra “A Gênese”, na parte de título “A GERAÇÃO NOVA”, Allan Kardec nos diz:

“Para que na Terra sejam felizes os homens, preciso é que somente a povoem Espíritos bons, encarnados e desencarnados, que somente ao bem se dediquem. Havendo chegado o tempo, grande emigração se verifica dos que a habitam: a dos que praticam o mal pelo mal, ainda não tocados pelo sentimento do bem, os quais, já não sendo dignos do planeta transformado, serão excluídos, porque, senão, lhe ocasionariam de novo perturbação e confusão e constituiriam obstáculo ao progresso. Irão expiar o endurecimento de seus corações, uns em mundos inferiores, outros em raças terrestres ainda atrasadas, equivalentes a mundos daquela ordem, aos quais levarão os conhecimentos que hajam adquirido, tendo por missão fazê-las avançar. Substituí-los-ão  Espíritos melhores, que farão reinem em seu seio a justiça, a paz e a fraternidade.
A Terra, no dizer dos Espíritos, não terá de transformar-se por meio de um cataclismo que aniquile de súbito uma geração. A atual desaparecerá gradualmente e a nova lhe sucederá do mesmo modo, sem que haja mudança alguma na ordem natural das coisas.
Tudo, pois, se processará exteriormente, como sói acontecer, com a única, mas capital diferença de que uma parte dos Espíritos que encarnavam na Terra aí não mais tornarão a encarnar. Em cada criança que nascer, em vez de um Espírito atrasado e inclinado ao mal, que antes nela encarnaria, virá um Espírito mais adiantado e propenso ao bem.”
“[...] A época atual é de transição; confundem-se os elementos das duas gerações. Colocados no ponto intermédio, assistimos à partida de uma e a chegada da outra, já se assinalando cada uma, no mundo, pelos caracteres que lhe são peculiares.
Têm idéias e pontos de vista opostos as duas gerações que se sucedem. Pela natureza das disposições morais, porém sobretudo das disposições intuitivas e inatas, torna-se fácil distinguir a qual das duas pertence cada indivíduo.
Cabendo-lhe fundar a era do progresso moral, a nova geração se distingue por inteligência e razão geralmente precoces, juntas ao sentimento inato do bem e a crenças espiritualistas, o que constitui sinal indubitável de certo grau de adiantamento anterior. Não se comporá exclusivamente de Espíritos eminentemente superiores, mas dos que, já tendo progredido, se acham predispostos a assimilar todas as idéias progressistas e aptos a secundar o movimento de regeneração.”
Segundo Juan Arias e muitos estudiosos dos Evangelhos, o ensinamento fundamental de Jesus era para que o homem cultivasse em si próprio o amor desinteressado pelos outros, como ele disse em Mateus 22:39, citando o Levítico 19:18: “Amarás a teu próximo como a ti mesmo”. Conforme eles, o dogma adotado pela Igreja, de que o homem se torna justo perante Deus, recebendo a recompensa eterna através da crença na morte e ressurreição de Jesus, para pagar os pecados da humanidade,  teria surgido devido a acréscimos posteriores nos evangelhos, não sendo aquilo que Jesus realmente acreditava. Isto está exatamente conforme o que o Espiritismo nos ensina.

De acordo com Juan Arias:

“Hoje há certa unanimidade entre os teólogos católicos e protestantes modernos de que Jesus imaginou um mundo futuro sem religiões, templos e catedrais. É verdade que ele era religioso, um judeu praticante que frequentava a sinagoga e o Templo, lia em público e interpretava as Escrituras, ainda que com um amplo sentido crítico quanto aos aspectos formais, rituais e legistas do judaísmo. No seu horizonte, no coração do seu segredo de um possível mundo futuro sem violências, abusos de poder e sem medo nem mesmo da morte, as religiões ritualizadas já não teriam espaço. Deus – pai e mãe ao mesmo tempo, homem e mulher – seria cultuado no âmago da consciência. Por isso, como anunciara à samaritana dos cinco maridos, não fariam falta templos e catedrais, pois adoraríamos “em espírito e em verdade” no altar mais profundo do nosso ser ou no grande templo da natureza, espelho do melhor da divindade.”

Foi o que os Espíritos Superiores da Codificação nos ensinaram há cerca de 155 anos atrás.

Quanto à época da chegada do Reino de Deus, Juan Arias nos diz:

“[...] Há quem chegue a pensar que Jesus se equivocou ao acreditar que o Reino chegaria durante o seu tempo de vida.”      
“[...] Contudo, Jesus afirmou que ninguém, nem os anjos ou ele mesmo, só Deus, sabia o dia e a hora em que nasceria a nova humanidade, a nova era, o mundo sem violências fundado no amor desinteressado.
“[...] Lucas tem um texto definitivo sobre isso que poucos quiseram examinar detalhadamente. Um dia, um grupo de fariseus pergunta a Jesus, talvez tentando confundi-lo, quando chegaria o famoso Reino de Deus que ele tanto anunciava sem jamais esclarecer de que se tratava. A resposta é fundamental: “Interrogado pelos fariseus, quando chegaria o Reino de Deus, respondeu-lhes Jesus, dizendo: ‘O Reino de Deus não vem ostensivamente, nem se poderá dizer: está aqui ou ali, por o Reino de Deus está entre vós.’” (Lc 17, 20- 21.)
“[...] Jesus chega a dar uma pista: Já está no meio de vós. Onde? Onde as pessoas menos esperam. Esse Novo Reino está germinando entre os que preferem a luz às trevas, não desprezam os pobres, sabem perdoar as ofensas e respondem à violência gratuita oferecendo a outra face.”

As palavras de Juan Arias, acima, concordam bastante com o Espiritismo, que considera o céu e o inferno como estados de consciência (Ver o texto Por que Devemos Fazer o Bem?, neste blog).

Assim, conforme demonstrado, os estudos atuais dos Evangelhos concordam bastante com a interpretação Espírita do que realmente nos ensinou Jesus.


BIBLIOGRAFIA CONSULTADA: 

1 KARDEC, ALLAN. O Livro dos Espíritos. Rio de Janeiro : Editora FEB,1995.;

2_____________ . O Evangelho segundo o Espiritismo. São Paulo : Editora Petit, 1997.;

3______________.A Gênese: Os milagres e as predições segundo o Espiritismo. Rio de Janeiro: Editora FEB, 1988;

4 ARIAS, Juan. O grande segredo de Jesus: uma leitura revolucionária dos Evangelhos. Rio de Janeiro.Ed.Objetiva, 2012;

5 EHRMAN, Bart D. Evangelhos Perdidos. Rio de janeiro: Editora Record, 2008;

6______________.O Que Jesus Disse? O Que Jesus Não Disse?: quem mudou a Bíblia e porque. São Paulo: Editora Prestígio, 2006;
7______________.Quem Jesus Foi?  Quem Jesus Não Foi? : mais revelações inéditas sobre as contradições da Bíblia. Rio de Janeiro: Ediouro, 2010;
8 ______________.O Problema Com Deus: as respostas que a Bíblia não dá ao sofrimento. Rio de Janeiro, Editora Agir, 2008;
9 RANGEL, Liszt. Arqueologia dos Evangelhos: uma releitura histórica do pensamento de Jesus. Recife: Editora Bom Livro, 2009;
10 SILVA, Severino Celestino da. Analisando as Traduções Bíblicas: refletindo a essência da mensagem bíblica. João Pessoa: Editora Núcleo Espírita Bom Samaritano, 2000;
11 PROPHET, Elizabeth Clare e PROPHET, Erin L.Reencarnação: o elo perdido do cristianismo. Rio de janeiro: Editora Nova Era, 2003.

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